No banco do penitente, sem medo de acreditar na bondade.


Tenho muitos defeitos. Impaciência não é um deles. A não ser quando sinto raiva de mim mesmo ou quando sou atendido ao telefone por uma máquina – para tal coisa digite tal número, e a espera tendo de ouvir musiquinha irritante –, não me apoquento em situações estressantes.

Às vezes minha esposa me acha paciente demais. Aí fico pensando se isso é bom ou ruim, pois como repetia a mãe dela, tudo de mais é veneno.

Esse dito popular não é só bordão de sogra. – Quando me refiro a sogra, nunca é com desdém. A minha era uma santa mulher. – É uma lição parecida com a de Aristóteles. Na escala das virtudes, paciência é meio termo da ira. De mais é irritabilidade. De menos, apatia.

Minha paciência de sobra será um traço de temperamento fleumático?

Tem hora que gostaria que predominasse em mim o tipo colérico, para ser mais impetuoso na busca da justiça. Outras, que avultasse o sanguíneo, para encarar a vida com mais leveza ainda. Mas não desprezo o lado melancólico, da introspecção que avalia melhor a realidade.

Lembram do Divertida Mente? Bonita a lição daquele filme de animação: a maturidade vem quando aceitamos a tristeza como parte do que somos. Até porque a vida não se resume a sorrisos produzidos para redes sociais.

Também me pergunto se paciência é realmente uma virtude.

No vaivém do seu pensar, São Tomás de Aquino problematiza: parece que paciência não é virtude. Virtudes serão perfeitas no céu e lá não haverá paciência, pois não teremos mais nenhum mal a suportar. Não há virtudes nos maus, porém alguns deles são pacientes no ofício da maldade. E se paciência é fruto, ela não é virtude, pois uma coisa é diferente da outra.

No entanto, a solução do problema desmente a aparência. No céu, não só a paciência, mas todas as virtudes não terão a mesma finalidade. A justiça, por exemplo, não servirá para governar nossos atos, mas para nos unir a Deus. Quanto à virtude nos maus, eles não são pacientes. Paciente é quem sofre o mal sem o cometer. Resultado: paciência é fruto, como obra virtuosa, mas também é virtude que acalma o coração ante as tristezas do mundo.

Paciência é “arte de padecer”. Não é indiferença à injustiça, nem mera resiliência. Pois como resume Santo Tomás, “só o amor é causa da paciência.” Nela, como explica o Papa Bento XVI, estão presentes a fé e a esperança. Não é conformismo de aguentarmos uns aos outros, mas abrirmos o coração para ampararmos uns aos outros. No dizer de Bento XVI, ela é “o rosto cotidiano do amor”.

Cotidiano que nos convida a praticar a sabedoria de amar: saber ouvir e saber falar; saber esperar e ir além de suportar. Com isso as mortificações da paciência não nos jogam no poço da angústia. Ao contrário, aumentam nossa paz interior.

Um dos espaços em que pratico a paciência é no banco do penitente. É assim que chamo os assentos nos shoppings. Minha esposa nas compras, e eu esperando sentado, de boa.

O termo penitente pode ser exagerado. E não quero me comparar com os penitentes do tempo de São Francisco, nem com os de Barbalha, da ordem fundada pelo Padre Ibiapina. Mas se até os do Ceará foram parar em programas de televisão e não se flagelam mais, o apelido do banco – usado com bom humor nas conversas com minha esposa – pode não ser tão descabido assim.

No fim das contas, o mais importante é a pessoa viver com serenidade. Quem sabe sob a inspiração do “Só por hoje” do Papa João XXIII. Só por hoje: tratar de viver cada dia, sem tentar resolver tudo de uma vez; cuidar das relações interpessoais; sentir-se feliz na certeza de ter sido criada para ser feliz; adaptar-se às circunstâncias, sem pretender que elas se curvem aos seus desejos; dedicar um tempinho a uma boa leitura – e eu me permito acrescentar, à música e outros prazeres da vida, pois nem só de pão vivem homem e mulher; praticar uma boa ação, sem contar a ninguém, muito menos exibir nas redes sociais; fazer algo de que não gosta, mas que é preciso fazer; cumprir as tarefas diárias sem pressa e indecisão; permanecer firme na fé, confiando na Providência Divina; não ter medo de apreciar o belo, nem de acreditar na bondade.

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