Um coração menino.*


Minha mãe gostava da música saga de um vaqueiro. Acho que nem tanto pelo estilo musical, mas pela história ali cantada, na qual mesmo sendo forte, o coração é um menino que ama, chora e segue seu destino. Como na letra da canção, peço licença para lhes contar um pouco de minha história. Mas não se preocupem. Minha fala vai ser mais curta que a música.

Muito do acontecido em minha vida não foi de caso pensado. E feito o verso de Manoel de Barros, quase sempre só compreendo o que faço depois que já fiz. Não pretendia fazer Direito, muito menos ser juiz. Vocação, nestes casos, foram os chamados da vida. Mas uma coisa parecia certa. Ser professor seria minha missão.

De minha mãe e meu pai herdei o gosto pelo magistério. Se o salário não era atraente, e a vida um tanto sofrida, o amor pelo que faziam era contagiante. Isso me faz lembrar Rubem Alves, ao comparar o sofrimento do professor à dor do parto. A mãe, dela logo esquece, diante da incomparável alegria de dar à luz o filho.

De volta à minha história, desde cedo ela se entrelaça com a da UEPB. Aos 8 anos, na volta das aulas no Antenor Navarro, ao subir a ladeira depois do Mercado Velho, avistei uma fila com muita gente: pessoas em situação de rua, de prato na mão, para almoçarem em nossa casa. Tinha sido a promessa por meu pai ter passado no vestibular de Estudos Sociais da então FAFIG.

Anos mais tarde, minha mãe, meu irmão, eu e minha irmã fizemos o curso de Letras. Fui orador na colação de grau, que fez 40 anos anteontem. E foi nesse curso que me fiz professor universitário, indicado pela professora Socorro Rosas, a quem sou grato até hoje. Não bastasse tudo isso, na UEPB conheci Gerley, que de aluna se tornou o grande amor da minha vida.

Ingressei na magistratura em 1993. E em 1994, tive a honra de ser um dos professores-fundadores do nosso curso de Direito. Depois de todos estes anos, que se passaram tão rápido por serem mais cheios de vida do que de tempo, estou me aposentando.

Daí a imensa emoção em poder viver este momento nesta solenidade. Formatura do semestre letivo 2023.1, das turmas do Centro de Humanidades. De coração, quero saudar e agradecer a todos que compõem nossa universidade.

Às formandas e aos formandos de Direito, Geografia, História, Letras/Inglês, Letras/ Português e Pedagogia. Às mães, aos pais, companheiras, companheiros, familiares, amigas e amigos, que contribuíram para a conquista de vocês.

Aos professores e professoras. Nesta profissão, aprendemos um pouco da sabedoria de Zaratustra, que ao compartilhar o que dentro dele habitava, tornou-se mestre na arte de ensinar felicidade.

Aos que tomam conta do nosso campus. Desde a direção e parte administrativa aos que, com dedicação, cuidam da limpeza, do jardim e dos gatos. Peço licença para lembrar Rejane Dantas, já na eternidade, com sua alegria cativante.

Agradeço a Deus por me permitir viver este momento. Às colegas e aos colegas do Departamento, pela indicação de meu nome para Paraninfo das turmas. Às alunas e alunos de Direito, por tanto carinho, e que me deram o presente inestimável de batizar o Centro Acadêmico com meu nome. Como dizia meu avô, Deus faça vocês muito felizes.

Prometi que seria breve. Termino lembrando mais uma vez a canção que minha mãe gostava. Tal qual o do vaqueiro da saga, meu coração parece um menino que chora de saudade e segue seu destino. Mas acima de tudo ama o que faz, e percebe, como ensina o professor Luiz Alberto Warat, que “o amor é o ponto de vista fundamental para a constituição não alienada dos componentes de uma cultura”, pois “quem não resolve o interrogante de como amar é impotente para encontrar respostas sobre como viver.”

* Texto do discurso como Paraninfo Geral das turmas concluintes da UEPB, Campus III – Guarabira-PB (25/07/2023).

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