

A Bíblia, nesse contexto, pode ser vista como uma grande parábola. Não é que todos os seus textos sejam ilustrações. Como forma literária, parábola é narração alegórica para ensinamento, com traços distintivos da fábula da literatura infantil, normalmente com a personificação de animais, e do apólogo, que também se vale da humanização de objetos, como no famoso conto da agulha e do novelo de linha, de Machado de Assis. Mas é que a Bíblia, como uma linha parabólica que aponta para o infinito, não pode ser medida pela régua reta da ciência.
As parábolas de Jesus são exemplos da palavra utilizada para comunicar verdades eternas. Por que Jesus, para ensinar a seus seguidores, não vai direto ao ponto? Assim questiona Edson Fernando, no livro Para quem tem fome de beleza. Para aquele Pastor, Jesus evitava o ensino retilíneo, de verdades prontas e acabadas, que precisassem apenas ser engolidas pelos seus interlocutores. Em vez disso, com a parábola, que à imagem e semelhança de Cristo, é criação e palavra criadora que toca e remexe as profundezas humanas, é como se Jesus comunicasse a nós o próprio ato criador.
O Padre Rômulo Cândido de Souza, no livro Palavra, parábola, observa que é uma insensatez querer que uma parábola seja comparada a uma crônica histórica. Parábola é sempre mais revolucionária e desafiadora que qualquer lógica humana. Na parábola do rico e Lázaro, até o inferno parece inusitado. Nele, o rico, mesmo condenado ao castigo eterno, reza e faz um pedido ao céu, sente compaixão por seus irmãos que ainda poderiam ser salvos, e mesmo não sendo atendido, chama Abraão de Pai, que o trata pelo nome de filho.
Como instigante aventura no mundo da linguagem, Palavra, parábola também remexe no sentido de alguns termos bíblicos. Kefa, por exemplo, não é apenas a pedra sobre a qual seria edificada a Igreja, mas também a cavidade na rocha. E como ekklesia é mais a reunião de pessoas do que um edifício, a etimologia e a simbologia autorizariam várias significações sobre a metáfora atribuída a Pedro, não apenas como pedra, mas a caverna escavada na montanha, onde seria gerado o povo de Deus, uma gruta para servir de abrigo aos mais necessitados.
A abertura à multiplicação de significações é característica do símbolo, expressão poética dinâmica e inesgotável. Daí que a parábola, como palavra que aponta para o infinito, é a mais apropriada para tangenciar a grandiosidade de Deus, que não pode ser medida pela régua reta da ciência, ainda que seja da Teologia, a ciência da fé. Como lembra o padre Rômulo, até a fé mais profunda tem seus limites, mas a ação de Deus rompe todas as fronteiras, seja da morte, do inferno ou da fé, e vai muito além de tudo o que se possa imaginar.
Gostei da explicação. Na verdade sempre gosto quando escritores se esforçam para tornar "um conteúdo dificil" em Algo fácil e intuitivo!
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