No
dizer de Ariano Suassuna, o otimista é um tolo, o pessimista, um chato; bom
mesmo é ser um realista esperançoso. Para mim, o cristão é, ou pelo menos
deveria ser, um realista esperançoso.
Ser
simplesmente otimista não é defeito de ninguém. Muito pelo contrário. Ver o
lado bom das coisas, e mesmo na dificuldade, esperar que elas melhorem, sempre
faz bem a qualquer um. E igual a Norberto Bobbio, quando reflete sobre o futuro
da humanidade, penso que se não temos certeza para onde os rumos da história
podem nos levar, também não temos o direito de espargir pessimismo ao longo do
caminho por onde caminhamos. O mal do otimista é exagerar na dose, o que pode
fazê-lo descambar para a ingenuidade. Não é por acaso que a máxima panglossiana
de que tudo que acontece é para o melhor nesse melhor dos mundos – que ganhou
as telas do nosso cinema, no filme Candinho, de Mazzaropi – antes de ser lição
de filosofia, é fruto da verve zombeteira de Voltaire.
Por
outro lado, ainda que às vezes o nosso mundo pareça o pior dos mundos possíveis
-- talvez por conta da sensação de que tudo vai de mal a pior, já que o mal faz
mais barulho e chama mais atenção que o bem -- tenho de concordar com o mestre
Ariano. É muito chato conviver com quem sempre espera o pior, gente que parece
ter uma nuvem carregada sobre a cabeça, como Uruca, do desenho animado, ou que
fica o tempo todo a se lastimar, feito outro célebre personagem de
Hanna-Barbera, Hardy, a hiena pessimista da série Lippy e Hardy, que sempre
repetia: Eu sei que não vai dar certo... Oh céus! Oh vida! Oh azar!...
Diferente
desses dois extremos, o cristão pode lidar melhor com a tensão de viver no
mundo sem ser do mundo. Sabe que a melhor das utopias jamais se compara com o
habitat natural que o aguarda na pátria da escatologia. E essa certeza fundada
na fé e na esperança, longe de lhe tornar alienado – afinal, o próprio Cristo
não se fez alheio à condição humana, mas entrou na história sem se limitar ao
mundo --, aguça ainda mais o senso crítico do cristão. Este, por exemplo, pode
participar intensamente de um processo político. Mas não troca sua fé por
ideologia partidária, sua caridade por bondades interesseiras, nem sua
esperança por promessas eleitoreiras.
Na
espiritualidade desse realista esperançoso, promessas que contam são as
promessas de Deus. E estas não se confundem com conteúdos de utopias sociais,
políticas e econômicas, embora o agir de Deus na história perpasse pelas
instituições humanas, nelas deixando vestígios de fé, amor e esperança, que só
serão plenificadas no novo céu e na nova terra que hão de vir.
Tudo
isso faz com que o cristão não seja um otimista ingênuo, tampouco um pessimista
chato. Pois agindo no meio em que vive, para fazer do mundo um lugar melhor
para viver, começa aqui e agora, a realizar o Reino de Deus. Ao mesmo tempo,
porém, não se perde na ilusão de achar que os projetos humanos são perfeitos,
autossuficientes, eternos. Pois tudo o que pode construir nesta terra é sempre
precário, como inevitavelmente precária é a condição humana. Com a sabedoria e
a humildade de quem não se nutre da soberba, o cristão, um realista
esperançoso, abre-se sempre ao mistério da transcendência, e sabe que enquanto
vive nesta terra será sempre um peregrino, ainda que o mundo ao seu redor possa
parecer o melhor dos mundos possíveis.
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