O sete da esperança



O fraco desempenho da seleção de futebol na Copa fez o escrete canarinho despencar quatro posições no ranking da FIFA. O time brasileiro é, no momento, o de número sete no mundo. Uma das razões da queda foi a goleada sofrida diante dos alemães, quando levamos de sete. Por outro lado, na arena mundial da economia, a nossa já é a de número sete entre todas as potências.

Sete não é apenas conta de mentiroso, como diz a sabedoria popular, mas um número extremamente importante desde as culturas mais antigas. Há quem relacione sua origem às quatro fases da lua, cuja beleza se renova no firmamento em períodos de sete dias, ritmando nossas vidas em semanas. Numa das versões da mitologia de Ugarit, Baal, o cavaleiro das nuvens, mata o monstro Lotan, o mesmo Leviatã, dragão de sete cabeças.

Na Bíblia, por sua vez, o sete simboliza plenitude. No Antigo Testamento, ao cantar a lei da vingança, que abastece a espiral da violência, Lamec diz que se a vingança de Caim valia por sete, a dele valerá por setenta e sete. Nos sonhos do faraó, as vacas magras são sete e as bem cevadas, também; sete as tranças de Sansão; sete os dias de pães ázimos, e para curar da lepra, sete mergulhos de Naamã. Já no Novo Testamento, são sete os pães multiplicados e os cestos com o que sobrou. De Maria Madalena, sete demônios expulsos. No Apocalipse de João, sete igrejas e candelabros, sete selos e trombetas. E na matemática do cristão, o perdão generoso das sete vezes transborda para as setenta e sete do amor que não tem fim.

Por que, então, ficar com vergonha do sete? Se há setes que desonram, há outros que dão orgulho. Se a seleção – que não se confunde com nosso futebol inteiro e muito menos com nossa pátria – no ranking é só a sétima, em que isso afeta nossa vida? Quem dera nossa posição no ranking do IDH, a exemplo da economia, fosse pelo menos a número sete, para batermos no peito e dizermos que somos uma população em que muitos têm vida longa e saudável, acesso ao conhecimento e padrão de vida decente!

Justiça seja feita: nossos pobres de outrora já viveram períodos de vacas bem mais magras. Mas desigualdade ainda é muita, e cidadania plena, privilégio de alguns poucos que sempre lactaram nas tetas das bem cevadas.  Há muito ainda por fazer, e não bastam surtos sazonais de patriotismo, nem gritar o hino a capela, para construirmos um país melhor de se viver. Quantos dragões de sete cabeças teremos de vencer para não termos mais de cinquenta mil homicídios por ano, principalmente de jovens?  Conseguiremos ser um povo cordial se nosso canto for de vingança, que alimenta a espiral da violência? Sete banhos de limpeza bastarão para lavar a lepra das corrupções de todos nós?

Da Copa podemos tirar lições. Se o time perdeu feio, nossa gente fez bonito. A seleção tomou um baile dos alemães, mas o nativo os ensinou a bailar.  Com eles aprendemos que o jeitinho brasileiro não basta, pois disciplina é sempre preciso; não basta o drible do craque, sem organização da equipe. Mas para eles e para o mundo deixamos imagens bonitas, de um povo tão hospitaleiro, cuja alegria de viver não deve depender só de vibrar com bola na rede, nem que sejam sete delas, e sim da ação de todo o povo, dos heróis anônimos do dia a dia, que produzem a sétima economia, mas não conseguem desfrutar de forma plena, da riqueza por nós todos produzida. Assim, o  sete que agora envergonha pode  apontar para um caminho de esperança.

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