Estudar e aprender

O fim da aprendizagem relaciona-se à questão da competência. Esta pode ser compreendida tanto como somatório de conhecimentos e atitudes exigidos para o exercício de certa atividade, quanto no sentido de ação não apenas cognitiva, mas também afetiva e social, que se revela na vivência humana, ou ainda como “domínio” de habilidades que compõem os diversos saberes.

Para alcançar o “domínio” das habilidades, o candidato a aprendiz precisa dedicar-se ao estudo. Mas será possível alguém estudar sem aprender ou aprender sem estudar?

Estudo é concentração de potencialidades pessoais para apreensão de dados que, em geral, conduzem à resolução de problemas. Pressupõe, portanto, que o sujeito do ato de estudar dirija intensamente seu pensamento e sua atenção para o objeto que pretende conhecer. Em outras palavras, é preciso que o estudante (ou o estudioso) se prenda de maneira efetiva à questão que deseja compreender.

Aprender, por outro lado, deve representar a obtenção do resultado esperado no ato ou na atitude de estudar. Esse resultado é, em linhas gerais, tomar conhecimento de algo, apoderar-se de um determinado saber, o que constitui a finalidade última de todos quantos se dispõem a estudar.

Sucede, porém, que nem todos aqueles que procuram aplicar a inteligência para adquirir novos conhecimentos logram êxito em seu intento. Pode acontecer, inclusive, um resultado oposto ao desejado, quando, ao invés de ter aumentada sua compreensão sobre o assunto, o candidato a estudioso se perde numa teia de dúvidas e incertezas. Teríamos, então, o estudo levando a pessoa a desaprender, e não a aprender.

René Descartes, a esse respeito, adverte que a pessoa que duvida de muitas coisas não pode ser considerada mais sábia do que alguém que nunca refletiu sobre elas. Ao contrário, ela padece de ignorância ainda mais grave, quando toma por verdadeiras, concepções manifestamente infundadas. Daí por que, segundo ele:

É melhor não estudar nunca do que ocupar-se de objetos de tal modo difíceis que, não podendo distinguir os verdadeiros dos falsos, nos vejamos obrigados tomar como certo o que é duvidoso, já que neles não há tanta esperança de aumentar a instrução como o perigo de diminuí-la.

Portanto, parece razoável a afirmação de que é possível estudar (ou pelo menos tentar estudar) e não aprender. Nesse caso, o estudo implica, em última análise, esforço ineficaz.

Inversamente, também é possível a apreensão espontânea e automática de determinado saber ou habilidade, como é o caso da aprendizagem baseada na imitação, ou ainda da aprendizagem, por assim dizer, intuitiva ou direta, a exemplo da que pode ocorrer no conhecimento místico ou religioso.

A ideia do conhecimento revelado, de iluminação imediata, pode ser observada tanto na filosofia agostiniana, quanto na ideia de visão direta, de alguns ensinamentos de Buda. Este, segundo se conta, levou a iluminação a um de seus discípulos apenas colocando diante dele uma flor, sem pronunciar uma palavra sequer. Nesse caso, houve aprendizagem sem estudo, e este, entendido no sentido tradicional de “trabalho” intelectual, representa esforço desnecessário ou inútil.

Dizer que tanto se pode estudar sem aprender, quanto aprender sem estudar, não resolve, por si só, o problema de quem se lança à procura de métodos mais eficazes tendentes a incorporar, compreender e, até certo ponto, “dominar” os saberes passados de geração em geração. Todavia, pode ser o primeiro passo para uma percepção mais clara do problema, e todo começo (ainda mais quando é um bom começo), como ensina Aristóteles, “é mais que metade do todo, e muitas das questões que formulamos são aclaradas por ele.”

Comentários

  1. Olá,

    Venho agradecer sua participação no Blog Amantes do Direito e informar que o caminho não é mais
    'michele-michelelarissa.blogspot.com'

    O novo endereço passou a ser:
    http://blog-amantesdodireito.blogspot.com/


    Fico feliz com sua presença por lá.

    Abraço,

    PS: Já sou seguidora aqui. ;)

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  2. Olá, Michele. Gostei muito do seu blog. Além de segui-lo vou recomendá-lo. Um abraço.

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