QUATRO DISCURSOS (2)

DIREITO, 1988

Não me imaginava nunca fazendo o curso de Direito. Quando fiz a complementação do curso de Letras, em Campina Grande, funcionavam no mesmo prédio (Colégio Anita Cabral), os cursos de Letras e Direito. Mas parecíamos habitar mundos bem diferentes e distantes. Porém, com o incentivo (ou o empurrão) dos familiares, de modo especial de meu irmão, Tércio, acabei virando bacharel, e, mais uma vez, orador das turmas do curso de Direito da Universidade Federal da Paraíba.

A aula da saudade foi ministrada pela professora Ivanize Marinho de Menezes, na Escola de Prática Forense, que funcionava no prédio da antiga Faculdade de Direito, em João Pessoa. A sessão solene de colação de grau foi realizada no Cinê Banguê, do Espaço Cultural, e o baile de formatura, no Jangada Clube.

Estes foram os concluintes:

Abraão Brito Lira Beltrão, Agamenilde Dias Arruda, Ana Adelaide Guedes Pereira Rosa, Ana Maria da Costa, Antônio Cavalcante da Costa Neto, Arlan Costa Barbosa, Cláudia S. Lessa F. Virgolino, Dorgival Terceiro Neto Júnior, Eduardo Ramalho Rabenhorst, Edvaldo Brilhante da Silva Filho, Elson Amorim de Araújo, Fábio de Siqueira Miranda, Genival Martins Barbosa de Lima, Guilherme Costa Câmara, Hércules Soares Barbosa, Ivanilda Cardoso de M. Novais, João de Assis Silveira Marques, Jomário Sampaio Monteiro, José Augusto de Souza Peres Filho, José Hilton Ferreira da Silva, Júllia Cristina do Amaral Nóbrega, Licélia Maria Cordeiro de Souza, Manuel Maia de Vasconcelos Neto, Marcus Frederico Claudino Veras, Maria Amália Ferreira de Araújo, Maria das Neves Carneiro, Maria de Fàtima de Assis, Maria Elizabeth M. da Silva, Mário Fernandes de Oliveira Filho, Monaldo Godoi Fernandes, Nelson Pereira Lima, Nilton da Silva Alves, Onaldo Rocha de Queiroga, Oneill Guedes A. de Carvalho, Paula Reis de Andrade, Ribamar de Mello, Roberto Fernandes Correia, Rogério de Meneses Fialho Moreira, Romero Carneiro Feitosa, Roseberto Santos Correia, Rósula Kelly Medrado Almeida Passos, Sérgio Rique Pereira Gomes, Sílvio José da Silva, Solange Machado Cavalcanti, Telma Paiva Leite de Andrade, Telma Roberta Vasconcelos Motta, Teozimar Campos Moreira, Tereza Helena Maria de Paiva, Thalma Sampaio de Lucena, Vanina Nóbrega de Freitas Dias e Waldimar Queiroz de Lima.

Começamos o curso de Direito em 1984, época em que se viveu mais um período de redemocratização do país, e concluímos antes da promulgação da Constituição de 1988. O tempo em que se deu o curso foi marcado pela tensão entre a velha e nova ordem jurídica. As grandes discussões da Assembléia Nacional Constituinte, instalada em fevereiro de 1987, refletiam os clamores e as contradições dos diversos segmentos da sociedade e, ao mesmo tempo, faziam-se ecoar na vida desses mesmos segmentos.

Discurso de formatura do curso de Direito

João Pessoa, 08 de janeiro de 1988

É preciso ritos.

Exupéry.

Hoje, dia 8 de janeiro de 1988: colação de grau da turma concluinte do curso de Direito da Universidade Federal da Paraíba, turma que se orgulha em levar o nome do ilustre e saudoso Desembargador João Pereira Gomes. É mais um rito em nossas vidas.

O Direito é, antes de tudo, rito dos homens para solucionar conflitos da vida. A vida nada mais é do que o grande rito em que o homem, na construção da história e de si mesmo, vai renovando a cada dia, o rito da criação. Há o rito do trabalho e o rito do amor; o rito da guerra e o rito da paz. E como a própria vida, que é sempre nova a cada alvorecer, um rito jamais se repete, pois traz nas entranhas o mistério da renovação da existência humana.

Por isso o curso de Direito da UFPB, seus professores e alunos, em unidade com todos os que se fazem presentes a esta solenidade, revestem-se no manto festivo da alegria rediviva. É como se, saindo da aparente mesmice do cotidiano, fôssemos subitamente guindados ao monte da transfiguração.

Mas é justamente do cimo da colina que melhor podemos contemplar o vale. Desçamos o monte para uma breve investida nesse vale de lágrimas: o Brasil — que ironia — da Nova República! Nem é preciso dizer muito. Está tudo aí: crise econômica, crise política, crise social, crise moral, crise institucional, crise de valores. Estertores de uma nação em que a esperança morre à míngua, o sol da liberdade não brilha com raios tão fúlgidos sobre a imensa legião dos depauperados de todo gênero, e a justiça social ainda é simples acalanto a embalar os sonhos do gigante adormecido em berço esplêndido.

Todavia, sábias são as palavras do saudoso Presidente Tancredo Neves: “a esperança é o único patrimônio dos deserdados, e é a ela que recorrem as Nações, ao ressurgirem dos desastres históricos.” Apesar de tudo, esperemos que a partir do caos em que estamos sucumbindo, possa ser plasmado um novo cosmos no qual a esperança renasça qual fênix maravilhosa.

Deve-se falar em crise não por modismo, mas porque é nesse caos, caros colegas, que iremos fazer a hora e a história, como homens e mulheres do Direito. Idealismo, nesse contexto, pode soar como algo quixotesco. Só que alguma coisa tem que ser feita e ninguém o fará por nós. Estaremos todos “soltos nesse mundo largo...”

Portanto, este não é o momento para a apologia do ceticismo ou para o desespero. Afinal, estamos apenas no começo de uma jornada, que esperamos seja repleta de êxitos, e os desafios poderão ser superados com humildade e coragem, inteligência e boa vontade.

Voltemos, então, à colina. É hora de agradecer. Em primeiríssimo lugar, a Deus, Supremo Autor do Universo, da vida e dos homens, nossa Verdadeira Esperança; aos pais, co-autores nessa empreitada divina, e aos nossos familiares, o sincero reconhecimento por tudo o que, sem a sua ajuda, jamais conseguiríamos conquistar; aos mestres, cúmplices da nossa teimosia na interminável perseguição ao saber, o nosso muito obrigado.

A gratidão reflete a humildade dos sábios. Alguns agradecimentos específicos devem ser feitos: ao jurista e professor Dr. Tarcísio Burity, governador do nosso Estado, por todo apoio à vida jurídica paraibana; ao nosso paraninfo, Dr. Humberto Lucena, o senador da Paraíba, símbolo da luta pela redemocratização do país; ao patrono das turmas, engenheiro Zenóbio Toscano, o mais dinâmico prefeito da nossa Guarabira, hoje centenária; à Dra. Onélia Queiroga, nossa madrinha, professora exemplar, coordenadora zelosa e dedicada na luta pela criação do Centro de Ciências Jurídicas da nossa Universidade; ao Dr. Antônio Elias Queiroga, nosso ilustre professor, a homenagem especial da nossa turma, e a todos que, de alguma forma, contribuíram para a conclusão do nosso bacharelado, a eterna gratidão que jamais poderia ser plenamente expressa pela “úlltima flor do Lácio”, apesar de belissimamente inculta e esplendorosamente bela.

Por fim, apenas uma palavra aos colegas bacharelandos. Honremos a nossa vida como profissionais do Direito, que é lindo por ser dialético campo de batalha onde não há donos da verdade. Mais do que capacidade intelectual, busquemos a sabedoria. Aprendamos a lição do Único e Verdadeiro Mestre, que nos adverte para o fato de que a lei deve estar a serviço do homem e não deve ser um instrumento para escravizá-lo. Lembremos que acima dos códigos estão os fatos; acima da lei está a vida, e que os homens estão sedentos de vida e não apenas de leis, pois como afirma o poeta Carlos Drummond de Andrade, as leis não bastam; os lírios não nascem da lei.

O discurso pára por aqui. O rito da vida, porém, continua a fluir como rio perene que deságua no infinito. Parabéns aos responsáveis por este rito; boa sorte, companheiros bacharelandos; a todos, muito obrigado.

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