O Deus desconhecido




Desconhecido quer dizer incógnito, ignorado, não conhecido. Mas, cá entre nós, você já ouvir falar de escritor mais badalado que o autor desconhecido, ou de guerreiro tão reverenciado quanto o soldado desconhecido? Sobre o primeiro, aposto que você já leu mais textos dele do que os meus. Já o segundo, para este não há nação que não lhe erga um monumento, nem qualquer outro herói que, como ele, mereça jazer sob o Arco do Triunfo em Paris, ou junto ao Pórtico Monumental erigido aos pracinhas no Aterro do Flamengo, circundado por jardins de Burle Marx. Não quero, porém, me deter em soldados e autores; desejo fazer como fez Paulo, apostolizar sobre o Deus desconhecido.

Estando Paulo em Atenas, não se contentou em disputar com os judeus na sinagoga. Subiu ao Areópago e dirigiu a palavra aos cidadãos atenienses. Disse-lhes que os considerava, sob todos os aspectos, os mais religiosos entre os homens. Pois, percorrendo aquelas ruas e contemplando os monumentos, descobriu um altar com a seguinte inscrição: “ao Deus desconhecido”.

- “Ora bem”, disse Paulo, “o que adorais sem conhecer, isto venho eu anunciar-vos.” Anunciou então que o Deus desconhecido é o que fez o mundo e tudo o que nele há; o Deus que não habita em templos de pedra, e não precisa ser servido por mãos humanas, como se carecesse de alguma coisa, pois é Ele que a todos dá vida, respiração e tudo o mais. É ainda o Deus que cuida para que todos, mesmo às apalpadelas, encontrem enfim a divindade, que não está longe de cada um.

A retórica de Paulo, naquele caso, seguiu por caminhos diferentes do discurso habitual de judeus e cristãos. Estes, em vez de uma teologia natural, mais acessível aos que buscam a divindade às apalpadelas, sempre preferiram colher seus argumentos na Escritura, canal de comunicação mais direto com o Deus desconhecido.

Só que até hoje, muito de nós, mesmo privilegiados por dispormos desse canal, se dependêssemos do conhecimento da Bíblia, continuaríamos a fazer como os gregos de outrora, professando a fé num Deus desconhecido. Pelo menos é o que se pode concluir de uma pesquisa sobre a leitura da Bíblia, realizada no ano de 2008, em nove países, oito da Europa (Grã-Bretanha, Holanda, França, Alemanha, Itália, Espanha, Polônia e Rússia) e Estados Unidos da América.

Os evangelhos são parte da Bíblia?; Jesus escreveu livros da Bíblia?; Quem, entre Moisés e Paulo, era personagem do Antigo Testamento?. Perguntas elementares como estas fizeram parte dessa pesquisa, encomendada pela Federação Bíblica Católica. Dos treze mil entrevistados, só uma pequena minoria respondeu corretamente as perguntas. Russos e espanhóis, com 7 e 8% de acertos, respectivamente, foram os piores classificados, enquanto poloneses, os que melhor se saíram, não passaram de 20% de respostas corretas. Tal resultado levou à conclusão de que a Bíblia, mesmo sendo o texto mais difundido no mundo, com traduções completas em mais de quatrocentos idiomas e versões parciais em mais de dois mil, ainda é bastante desconhecida, mesmo entre aqueles que haurem sua fé nas Escrituras.

É bom, portanto, dar ouvidos a Paulo, que continua a tomar a palavra nos Areópagos do nosso tempo, pois o que adoramos sem conhecer, isto é o que precisamos anunciar.

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