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Quando se fala no romance 1984, é comum que logo venha à mente a imagem do GRANDE IRMÃO DE OLHO EM VOCÊ. Há quem diga que essa imagem inspirou a criação do Big Brother da TV, programa que particularmente não gosto, e por isso não assisto, embora nada tenha contra quem gosta e assiste. No mundo em que vivemos, mais de 70 anos depois da publicação do clássico de George Orwell, diferente da distopia vivida pelo personagem Winston Smith, nem precisa de TELETELAS com seus ouvidos que nunca dormem, nem de Polícia de Ideias, para imaginarmos que todo som que fazemos pode ser ouvido, e todo movimento, monitorado.

Com a HIPERCONECTIVIDADE, SITES e aplicativos não só satisfazem nossas comodidades, mas denunciam onde estamos, o que fazemos, do que gostamos, quase sempre com informações entregues de bandeja por nós mesmos. Parece impossível fazermos qualquer coisa sem deixar rastro digital. E mesmo que se tenha uma lei para protegê-los, como passamos a ter agora, não é fácil blindar nossos dados pessoais sensíveis.

Mas o universo criado por Orwell é muito mais complexo que a vigilância permanente do GRANDE IRMÃO. Ele retrata uma estrutura oligárquica coletiva, cujos slogans do Partido dominante são: GUERRA É PAZ, LIBERDADE É ESCRAVIDÃO, IGNORÂNCIA É FORÇA.
A guerra permanente serve para manter o equilíbrio entre os superestados, não como ato essencial de destruição de vidas, mas dos produtos do trabalho humano. A ideologia dominante é de que o ser humano livre está sozinho e destinado à morte, mas unido ao Partido torna-se imortal e todo poderoso, e que é preciso influenciar negativamente as massas, pois sem contar com termos de comparação, elas sequer terão consciência de que são oprimidas.

Para manter a estrutura de controle e dominação, é preciso espalhar mentiras e acreditar nelas. Por isso não é estranho que naquele país fictício, o Ministério da Paz cuide da guerra, o da Verdade trate das mentiras, e o do Amor pratique tortura. É conciliando o inconciliável que se pretende manter o poder indefinidamente.

Neste ano de pandemia, um Ministro do Meio Ambiente pregou o afrouxamento da proteção ambiental. O Presidente disse para deixarmos de ser maricas e enfrentarmos de peito aberto uma doença que já matou mais de cento e sessenta mil de nós. Um negro, dirigente de uma fundação nascida da luta dos negros, tachou o Dia da Consciência Negra de instrumento de ressentimento racial, e fechou os olhos para o espancamento até a morte de um homem negro, na véspera desse dia. Também neste ano, uma parcela de pobres e negros elegeu candidatos cuja prática é de quem pensa que a ignorância das massas é alimento para sua força política. Mesmo no aparente absurdo, às vezes a vida imita a arte.

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