O juiz do futuro



Vez por outra me ponho a pensar sobre a responsabilidade de ser juiz. É quando me permito sonhar com o juiz do futuro, aquele que, segundo Jacques Charpentin, será:

cavalheiresco, hábil para sondar o coração humano, enamorado da ciência e da Justiça, ao mesmo tempo que insensível às vaidades do cargo, arguto para descobrir as espertezas dos poderosos do dinheiro, informado das técnicas do mundo moderno no ritmo desta era nuclear, onde as distâncias se apagam e as fronteiras se destroem, onde, enfim, as diferenças entre os homens logo serão simples e amargas lembranças do passado.

Ora, um sujeito assim, ao meu ver, não corresponde à imagem do intelectual, mas a do sábio. Sábio tanto no falar e no agir, quanto no ver e ouvir as coisas ao seu redor com simplicidade, clareza e perspicácia. É claro que esse conhecimento justo das coisas não pode ser um empreendimento exclusivamente humano, pois se a sabedoria consiste em ver nitidamente a realidade, e ouvi-la com limpidez, não foi outro senão Deus Quem fez o ouvido para ouvir e o olho para ver.

Percebo também, na descrição do juiz do futuro, três dos atributos da sabedoria: a prudência, a humildade e o discernimento.

Prudência como qualidade de quem age procurando evitar tudo aquilo que acredita ser causa de erro ou de dano, virtude ligada à difícil arte de saber ouvir. Naturalmente, o saber ouvir em muito contribui para outra qualidade do homem prudente, que é saber dizer a palavra certa na hora certa, pois, como ensina a Sagrada Escritura (Pr, 25, 11), “maçãs de ouro com enfeites de prata/ é a palavra falada em tempo oportuno.”

Humildade, não como sinônimo de baixa auto-estima. Ao contrário, como busca incessante e sincera de autoconhecimento. Alguém já o disse, fazendo coro com o pensamento socrático, que inteligente é quem outros conhece; sábio, quem conhece a si mesmo.

Por último, o discernimento, que é a faculdade de julgar as coisas com agudeza de espírito. A sabedoria, nesse caso, reside sobretudo numa justa avaliação e julgamento da injustiça e da maldade.

E é justamente por sonhar com esse juiz do futuro, que me sinto tocado pelas palavras de Carnelluti que, indagando a si próprio como pode fazer o juiz ser melhor daquilo que é, chega à seguinte conclusão:

A única via que lhe é aberta a tal fim é aquela de sentir a sua miséria; precisa sentirem-se pequenos para serem grandes. Precisa forjar-se uma alma de criança para poder entrar no reino dos céus. Precisa a cada dia mais recuperar o dom da maravilha. Precisa, cada manhã, assistir com a mais profunda emoção ao surgir do sol e, cada tarde, ao seu ocaso. Precisa, cada noite, sentir-se humilhado ante a infinita beleza do céu estrelado. Precisa permanecer atônito ao perfume de um jasmim ou ao canto de um rouxinol. Precisa cair de joelhos frente a cada manifestação desse indecifrável prodígio, que é a vida.

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